sábado, 30 de julho de 2011

Riso Vertical

Sorriso de cima pra baixo
encaixo um dente no outro
não quero seu queijo
nem quero seu ouro
Se é pra sorrir, dou um riso solto
riso alto
Só rio se navegável
eu piso em ovos
e me sinto inquebrável
em folhas secas
me torno outono
em tronos novos
o choro abandono
e bem por isso
inquebrantável
armo este sorriso
impossível sono
sono sem sonho
alegria
antes da alegria
os pomos
corredor de riscos
estrondos
se amor belisco
amor proponho
os planos
desenhos, rabiscos
estranhos
o amor e o Obelisco
os teus olhos castanhos
voo alto
aeroplanos
mil planaltos
distância e quando
um beijo assalto
seus olhos tamanhos
gargalhadas cadentes
sons de piano
alternância das teclas
e quando é teu o quando
o queixo salta
queixadas
e eu abocanho
leões trucidando
sou bicho da selva
das embrenhadas
e se calmo na relva
contemplo seu nada
Sou bicho da seda
e na seda solto um riso
minha fronte esfumaçada
é leve, eu sinto
Absinto, não me abstenho
se alegria eu tenho
venho com vinho
se um canto improviso
é partindo das matas
morrendo o ser vivo
deixa outro na estrada
não desatino
embora clandestino
não desatino
embora para o nada
para nada sorrimos
sorrimos selvagem
faça chuva ou estiagem
saltamos aos gritos
espantando as risadas
honrados camaradas
vejam o monolito
essa é nossa bagagem
o som da chuva
é o sorriso das nuvens
o som do mar,
das águas
sorri também aquele que tem mágoa
pois cansou-se de chorar
aqui, ali, alhures
me atento as paradas
e ouço baixinho
o sorriso das lágrimas
e bebo
na fonte inventada
se me entorno nas águas
sou líquido
mas não liquidado
não sou Narciso,
não sou o belo Filebo
se bebo dessa água,
se bêbado chego em casa,
dou um sorriso imenso
imerso no álcool
não sou Cupido
pois esse é frustrado
não piada
nem setas
nem facas
nem riso de Sátiros
nem Sísifo, nem Sócrates
nem sífilis
nem Mefisto ou Hipócrates
não curo essas armas
se trepo nas árvores
sou elas: folhagens
mergulho em miragens
e hoje tenho vontade
de sorrir de baixo pra cima
quero outro e quero outro
sorriso simples, fácil, gostoso
a boca de mulher
o sorriso depois do gozo
outro e outro
como o verso frutuoso
versante versátil
paladar saboroso
feito este
de baixo pra cima
volátil
voluptuoso
com rima ou sem rima
formoso
formoso


(Leandro Acácio e Sérgio L. Nastasi)

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Moça da fruta

moça que passa e rouba a feira
eu quero vê-la
eu quero revê-la
   
não quero tê-la

quero somente suas frutas

suas uvas

seus abacates

quero saber se é verdade

que beijo tem gosto de pêra

ou se de tomate



quero saber se suas ancas são laranjas



quero saber nessa quarta

se a feira é dos livres

dos muito à vontade

quero beijar sua franja



moça que deve ficar vermelha

quando envergonhada

não como a melancia

mas sim como a goiaba



 moça que passa
faceira

e num furto matreiro

engana os covardes

os donos da feira



moça que pega e não paga

um fruto maduro

e fora do cacho

e fora da tábua



moça ladina que passa

mulher do meu ritmo

és do homem a graça

fruto marinho



quero a sua deliciosa frescura

e a saia flutuante

espero que não saia antes

de experimentar a minha doçura




(Leandro Acácio e Sérgio L. Nastasi - julho 2011)

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Em outras palavras



Ana Borm e Sérgio L. Nastasi



Não há tantas palavras para descrever um sentimento,

mas há muitas sensações que nos submetem,
ainda mais quando  todo olhar faz transmitir um efeito luminoso,
 quente e tão incomum de se ver.
pois está mais penetrante e mais vivo
a partir de quando se deixa brilhar,
vagueando sobre ondas veneráveis.


diz-se que é o começo do indivíduo
de quem que se depara em vão
com o vão
 que há depois da despedida.

porém, não me esqueceria dos abraços que fizeram diferenças 
nas expectativas de te rever,

pequena fonte celeste

e os dicionários nunca dizem
o prazer que é mastigar cada letra da palavra Leite.

então, chega de palavras por um momento,
quero abraçá-la fora do poema,
quero falar diretamente.


e o que você fará de mim quando,
um dia,

todas as minhas palavras entrarem na sua boca?

a palavra Língua,
o idioma inteiro,
francês, inglês, castelhano...
demorará muito?
um ano?

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Na entrada e na saída...




Que é o Beijo-em-si-mesmo?
complexo de lábios,
a ciência cuida do saber,
a filosofia do nem saber.

Vai Maria filósofa beijar Édipo,
abandone o velho Judas,
ajude-o a trair seu próprio pai

quantas vezes foste desvirginada
— e disseste “amém”?
quantas vezes maculada
— e disseste “vem”?

com quem compusera seus versos de carne?
com quem deitaste em pura farra?
para que se ouvisse o grande verso
para que se abrisse um morno inferno
entre as pernas: desarme
quantos pretendentes ciclópicos
quantos monstros subalternos
quando não usaste teu charme?

é pura verdade, Maria,
que todos foram benditos,
na entrada e na saída?
é bem provável que sim,
tu cegastes os olhos da fé
para que não houvesse um fim
traiste inclusive José
imagino o que será de mim...
Intercederás?
Eu que andei com capiroto
com o dito cujo Satanás

eu que amei seu filho
vivo
homem
em sangue e vinho
para que foste também minha

Mas a senhora pouco sorri
perdeu toda a graça

pregaram o teu moleque num poste
num poste da Eletropaulo,
São Paulo,
Pari

uma criança pobre
claro escuro
um bambino por sobre o muro
morrendo eletrocutado

Depois disso a senhora deu em que lugar?
norte da Galileia?
apareceu aparecida?
Ceará...
Sertão,
nordeste da Judeia...
não,
tu correra os mares da Lídia

tu que amava o orgasmo
se tornara a mais frígida
entre as mulheres


(Leandro Acácio e Sérgio L. Nastasi - julho 2011)

terça-feira, 19 de julho de 2011

Mar Vertical



Mar Vertical
caia sobre os prédios
Marreal
transforma tudo em areia
areal
     caia sobre os tédios
foi um rio que passou
foi a vida que secou e rebrotou
que eu deixasse de ser parado
      me livrasse da inquietude
que eu deixasse de ser parnaso
a me lavar em outras altitudes
que eu fosse um ato forte
ou escapasse das similitudes
e do embaraço
lhe daria os olhos vivos
as águas vivas
parece encher de vida o seu regaço
aquilo tudo que rima tempo e espaço
é água no ar
pra cima
arregaço náutico
o beijo das serpesa crise de deus
o mar fantástico
não sei se suprassumido
sumiço de um barco
não sei se super achado
na baía sem casco
numa ilha
num arco sem triunfo
encalha lá no topo superlotado
barco de pau-a-pique
Titanic é seu apelido
madeira sem fundo
argonautas seus tripulantes
com flautas, berrantes
violas lisas,
turbantes
meretrizes
menestréis
alaúdes e alambiques
lá pra cima tudo é agua
poema que não se acaba
como a foz que não se desnutre
pelos fundos tudo é m'água
no porão das mil palavras
somos corvos ora abutres
chamem Moisés
chamem Mozart
pois quantos cruéis helicópteros
subiram
pra pegar ostras
para apanhar conchas
moças-pérolas
e asa deltas
como é duro navegar nas névoas
aves enjoadas
naves revoadas
vi granizo feroz
cortando
o piso
a atmosfera
nuvens velhas
pessoas com guelras
flutuantes
plantei um planeta
de flores velozes
despetalantes
Ode ao Mar Vertical
calle dos afortunados
Ode ao madrigal que o canta
na madrugada
claro
na madrugada
sonho caído dos olhos
águas que não me lavam
que só molham
me chame de Eneida!
foda-se a décima segunda sílaba!
montem as baleias
pois são aladas
e mesmo líricas
badaladas
e de pronto
e de pronto, ele repetiu,
despenquei do Mar alto
dizendo na cabeça
nunca é demais reler a Ilíada
e ser ilha
ser filha
rever Ulisses
e beijar Calipso
ancorar em outras orlas
quero passar a liça nas moças
e mão em suas hortaliças
ode ao Mar Vertical
pois o mar caiu
no ponto final
de um ônibus
de uma nave
Mar Vertical
além da vértice
vertigem
sem fim
sem grau
além do horizonte
tolices
o pensamento que singra
e descobre o mar o caos
e enfins
fins


(Leandro Acácio e Sérgio L. Nastasi - julho de 2011)